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A Ética do Amor na Relação Pais e Filhos

  • Foto do escritor: Sheila Antony
    Sheila Antony
  • 15 de nov. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 21 de out. de 2021

Participei da II Jornada de Psicologia Humanista com o título O Sentido Ético nas Relações Contemporâneas, organizado por Rosana Zanella e Liu Pinheiro, em nome da FMU. O tema que tratei foi A ética do amor na relação pais e filhos. Descrevo a ética como um conjunto de valores, crenças, regras, conhecimentos que regem a conduta (o modo de ser) do ser humano com o fim de instituir uma forma justa, pacífica e virtuosa de interagir e se comportar em sociedade. Tem como primazia o bem viver, o conviver em harmonia. A ética presume o amor como fundamento. Só o amor confere valor às ações humanas. Nesse sentido, a ética do amor exige regras a serem respeitadas entre aquele que ama e aquele que é amado. Quem ama quer a felicidade do outro.


O amor é o sentimento que rege a vida humana, que conduz a humanidade. O amor é fruto do encontro entre seres humanos. O amor une, integra, completa. Contudo, o amor requer momentos de separação, o que conduz ao sentimento de perda. As perdas incluem não somente a morte de pessoas amadas, mas perdemos por abandonar e ser abandonado, por deixarmos coisas para trás para seguir o próprio caminho. As perdas incluem não apenas separações e partidas, mas a perda consciente ou inconsciente de sonhos, de expectativas, de ilusões de liberdade e poder, de segurança, a perda do próprio eu que vai se transformando fisicamente e psiquicamente, vendo-se vulnerável e mortal.


Há ainda as perdas relacionadas a perda primária da conexão mãe-bebê, a qual o ser humano permanece em eterna busca. O desenvolvimento e crescimento psicológico leva-nos a: 1) consciência de que nossa mãe vai nos deixar e que vamos deixá-la. 2) o amor de mãe jamais será só nosso. 3) que a dor do machucado nem sempre passa com um beijo. 4) que os nossos pais tem defeitos e não são todo poderosos. 5) que teremos de aceitar nos outros e em nós mesmos um misto de amor e ódio, de bem e mal. 6) que há falhas em qualquer relacionamento humano. 7) que perderemos todos que amamos, pois somos mortais. 8) que teremos de dar conta de nós mesmos (Judith Viorst, no livro Perdas Necessárias).


As perdas e separações são necessárias para o crescimento e a individuação. Dói para algumas mães e pais enxergarem e aceitarem as perdas oriundas do crescimento e da separação dos filhos. Crescer requer renúncias. Amar, perder, conquistar. O amor pelo outro aparece simultaneamente com o reconhecimento da própria existência - eu existo, logo tu existes. A separação permite o conhecimento de que eu sou distinto de você, define fronteiras, dá início ao parto psicológico.


As perdas ligadas à relação pais-filhos são inevitáveis, inexoráveis, pertencem ao universo psíquico humano. A 1a. separação/perda é quando o bebê é lançado fora do útero protetor. A 2a. separação/perda é o desmame. Nascem os dentes, a criança necessita de alimentos sólidos para morder, mastigar, destruir, assimilar o alimento externo. O leite já não a alimenta, não a sacia. A criança passa a usar o seio como chupeta, consolo, conforto. Após 1 ano, quando a criança já anda, corre, ela dá início ao desprendimento da mãe, deseja a autonomia, quer livrar-se das mãos que a seguram para não cair, porém, que a impedem de correr. Amamentar dá à mãe a sensação de onipotência e grandeza, por isso, algumas querem manter a criança no seio paradisíaco. Afirmo que a necessidade é da mãe e não da criança (que já não é mais bebê) em retê-la no seio. Isso retarda a independência da criança e a inclusão do pai, no lugar de homem, pertencente à família. A 3a. separação/perda é a aquisição do controle esfincteriano. Esse período representa a conquista do domínio do corpo e da vontade própria, a passagem da liberdade e do prazer para a responsabilidade e o controle. A criança decide quando quer eliminar a urina e as fezes, o que lhe confere poder e autonomia. A 4. separação/perda é o momento de ir à escola. Ela deixa o útero protetor da casa, os braços cuidadores dos pais para experimentar e enfrentar o ambiente. A 5a. separação/perda é a sexualidade. Sente interesse e desejo sexual por um outro, o que assusta alguns pais. A 6a. separação/perda é o namoro e/ou casamento. Ao viver uma relação amorosa com alguém externo à família, introduz um corte no vínculo afetivo com os pais.


A ética do amor na relação pais-filhos presume o incentivo à separação, à individuação, à autonomia, à realização pessoal. A ética do amor pressupõe amor incondicional e respeitoso que faz despontar sentimentos de aceitação, autoconfiança, segurança, empatia. O amor ético funda na criança o sentimento de ser digna de ser amada e de ser capaz de amar, de sentir-se feliz do jeito que é, de valorizar o outro em sua individualidade e diferença. O amor transforma a ética de negativa em positiva, do não-fazer para a alegria do agir, da frustração para a autoestima, do isolamento para a vida em comum.


A criança move o que há de mais sagrado em nós. É ali em seu coração que habita o divino, o eu verdadeiro, original e real capaz de compaixão, perdão, amor incondicional, força que subjaz por trás de toda dor e temor. A criança crê na bondade do ser humano, ela possui qualidades transcendentais, que transbordam em ternura amorosa e alegria de viver. (Trecho do meu livro Transtornos clínicos da infância e da adolescência: um olhar compreensivo da Gestalt-Terapia, capítulo O divino que existe na criança).

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