O Adolescente e seus Conflitos
- Sheila Antony
- 17 de jun. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 13 de out. de 2020
A adolescência, por si só, constitui um período turbulento, em função das diversas transformações simultâneas que ocorrem no organismo. A mudança fisiológica no corpo, por meio de processos neurohormonais, altera a percepção psicológica do adolescente sobre sua identidade sexual e subjetiva, que afeta sua visão de mundo e da sociedade. A busca pela independência e, ao mesmo tempo, pela inserção social, a qual implica em ser aceito pelo grupo de pares, cria um mundo de contradições na mente do adolescente; ora quer ser dono de si, ora se submete a opinião alheia. Mergulha em indagações sobre o futuro quanto a desejos, sonhos, expectativas em contraposição ao presente real, cheio de incertezas: o que vou ser (em relação à profissão); quem sou eu (em relação à personalidade e sexualidade.
Destaco alguns pontos importantes no processo de adolescer:
Luto do corpo: a passagem do corpo infantil para o adulto provoca estranhamento, angústia, tristeza, medo diante das mudanças. O corpo de criança é essencialmente motor (explora os movimentos, a força, o equilíbrio, a postura), enquanto o corpo do adolescente torna-se sexualizado, erotizado (sou desejado e desejante).
Definição da identidade sexual e subjetiva: o caminho da autodefinição e autoafirmação é repleto de desafio, oposição, negação do outro. Para definir e afirmar o eu precisa se opor às exigências externas. Opor-se significa tornar-se capaz de dizer não, enfrentar o outro diferente, assumir seus desejos e vontades distintos, sair da “caixinha”, dando curso ao novo eu emergente.
Luto dos pais: sentimento de desilusão e tristeza pela desmitificação dos pais, em que reconhece as deficiências, insuficiências, carências, limitações de cada um. A mãe e o pai passam a ser visto como pessoas com personalidade própria, não mais são os todo-poderosos, os detentores do conhecimento. Agora, julga-os, aponta seus erros, mas sofrem com essa descoberta, pois ainda precisa do apoio dos pais.
Libertação da autoridade parental: movimento de desprender-se das normas e exigências parentais. Deseja a emancipação, a autonomia, a liberdade de ser, de escolher suas experiências. Para isso, necessita efetuar a separação subjetiva dos pais, o que representa livrar-se das imposições, dos anseios, das expectativas dos pais (das introjeções familiares).
Apresento dicas para os pais:
Renegociar os limites na fronteira do contato. Os pais precisam reconhecer as novas necessidades do adolescente quanto a horário de estudo, de sono, de alimentação, de vida social. O diálogo é fundamental, bem como o exercício da confiança por meio da atribuição da responsabilidade por suas escolhas.
Incentivar a autonomia com responsabilidade. O incentivo à autonomia dá motivação ao adolescente ir em direção à realização pessoal, desenvolve a autoconfiança e fortalece o vínculo amoroso. Dar autonomia não significa perder autoridade, ao contrário, demonstra uma forma de exercer o poder com consciência, o que propicia segurança e confiança.
Revisitar o seu adolescente. É de valiosa importância os pais rememorarem o adolescente que foram, junto com seus dramas, ansiedades, desejos reprimidos para serem capazes de se colocar no lugar do filho e assim agirem com compreensão e suporte.
Realizar atividades juntos. O adolescente gosta de participar de atividades em conjunto, desde que sejam lúdicas, alegres, coerentes com as habilidades individuais. Podem cozinhar, dançar, cantar, realizar jogos de tabuleiros (dominó, quebra-cabeça), jogos corporais (mímicas, twister), ler poesias/livros. Recriem-se, reinventem-se e reinventem a família. Busquem a criatividade de cada um, o talento individual, a pérola pessoal escondida.
“Aonde há diálogo, há contato saudável, há harmonia e integração”. Reconheçam, contemplem, admirem a pessoa em construção do seu filho(a).
Sugestões para os psicoterapeutas:
Trabalhos com a caixa da esperança: fazer uma caixa e colocar pensamentos otimistas e esperançosos em relação à família, ao mundo, às pessoas.
Trabalhos com a caixa das lamentações e das palavras: fazer caixas separadas para colocar as queixas, os lamentos em relação à vida, às pessoas, os amigos, à família; escrever as palavras mortíferas, ferinas, doídas que já ouviu dos pais, amigos, parentes; escrever palavras não ditas, aquelas que gostaria de ter dito aos pais, amigos, parentes, professoras e colocar na caixa das palavras.
Trabalhos com o corpo. Facilitar a expressão emocional por meio do corpo, soltar as tensões localizadas em certas partes do corpo. Dar consciência corporal sobre aquelas partes não aceitas, bem como aquelas que se agrada e associar com pensamentos e sentimentos.
Trabalhos para definir e fortalecer o eu (a caixa do eu): escrever o que gosta e não gosta; o que prefere e não prefere; o que quer e o que não quer para si; listar suas qualidades, habilidades e supostos defeitos; destacar lugares, passeios, atividades, comidas, filmes, seriados, jogos, comidas preferidos. Explorar.
Trabalhos com o futuro. Desenhar, escrever, pintar, fazer poesia sobre o que deseja conquistar, realizar, ser; incluir seus anseios para um mundo melhor.
A caixa do eu ou self pode ser vista no livro "A clínica gestáltica com adolescentes: caminhos clínicos e institucionais", organizado por Rosana Zanella, no qual escrevi um capítulo sobre o "Adolescente com transtorno de conduta".
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